29.3.07

“La Blanche Hermine”

Em resultado de contactos, quer por e-mail, quer telefónicos, com amigos monárquicos franceses legitimistas da Bretanha tenho recebido regularmente este pequeno jornal bi-mensal. “La Blanche Hermine” contem artigos interessantes sobretudo de carácter histórico que dizem respeito aos trágicos acontecimentos revolucionários no Oeste de França (Bretanha e a Vendeia) onde, como se sabe, ocorreram os piores massacres de milhares de civis inocentes por parte da I República francesa que felizmente foi de curta duração. As brigadas que se bateram heroicamente contra as “Colonnes infernales” da República receberam o nome Chouanerie do termo “chouan” (coruja) visto que os seus membros imitavam o seu ruído como forma de comunicar entre eles sem serem detectados. Os legitimistas festejaram recentemente o nascimento da Princesa Eugénie de Bourbon filha do Duque e da Duquesa d’Anjou. Além disso traz artigos sobre a actualidade nacional francesa, da região e internacional. Neste último número há mesmo um artigo a falar do nosso recente referendo para a liberalização do infanticídio pré-natal que retrata bem o que se passou no nosso país e a marcha impiedosa das “forças do progresso”. Num país tão descristianizado como é a França, e não só, um pequeno jornal como este é algo de precioso e inestimável porque representa um núcleo de resistência ao tumor jacobino e maçónico que destrói a alma daquela que em tempos foi a “Filha dilecta da Igreja”. Para mim que estou muito habituado a lidar com franceses e conheço bem a sua mentalidade e tendência para a arrogância falar com estes monárquicos é falar com uns franceses estranhos na medida em que, contrariamente ao francês “comum”, aceitam críticas em relação à França e vêem-na tal como ela é visto não estarem contaminados pela ideologia do regime.

António Bastos

26.3.07

O boy socialista

Convidado por um amigo, agente de viagens, participei numa viagem ao Porto e ao concelho de Matosinhos inserido num grupo de profissionais deste ramo. Uma das actividades que constavam do programa era uma palestra dada pelo referido boy, detentor de um importante cargo na Câmara Municipal desta última localidade. Este fez-se deslocar no habitual Volvo, tão ao agrado desta casta, e conduzido por um chofer, ambos generosa e gratuitamente colocados ao seu serviço pelos contribuintes para que, aqueles que com tanto “engenho e arte” os servem, sejam aliviados das agruras de tal múnus. A conferência, interessante, foi a propósito do potencial turístico gerado pelas obras dos grandes arquitectos, da “gauche caviar” (confesso que não gosto muito desta expressão gaulesa porque a considero um pleonasmo), nos referidos concelhos. Falou-se inevitavelmente do “meteorito”, isto é, a Casa da Música como lhe chamou a Maria Filomena Mónica, e que segundo ele nos comunicou custou a bagatela de 250 milhões de euros, mais do que a “mastaba” de Cavaco Silva (qual Ramsés II!), isto é, o CCB. No final, e de uma forma algo tímida e pseudo ingénua, acerquei-me do boy para lhe perguntar se sabia qual o montante inicialmente previsto para a construção, ao que este me respondeu que foi mais do que o previsto, procurando assim furtar-se a uma questão que aparentemente lhe causava algum incómodo. Voltei então à carga pedindo-lhe números mais exactos, ao que ele me respondeu: “cerca de 100 milhões de euros!” Perante a minha expressão de pseudo espanto, visto que já tinha uma ideia da “derrapagem”, disse-lhe: “se as empresas privadas fossem geridas assim que seria de nós!”. Ele confessou, então, compreender a má imagem que todas estas obras têm perante a opinião pública mas garantiu-me que estava a ser feito um esforço de contenção…Explicou-me todavia que tal derrapagem se deveu à quantidade de betão utilizada ter sido muito superior à inicialmente prevista. Não serão as clientelas (construtores e empreiteiros e indirectamente a partidocracia) a recompensar habitualmente neste tipo de obras emblemáticas do regime, o betão a que se fere o nosso boy?

21.3.07

Colecção de repúblicas?

Acabo de saber que a candidata presidencial francesa, Ségolène Royal, propôs recentemente a criação de uma VI República em França o que não deixa de ser caricato tendo em conta um regime que, para além de ir já na sua quinta versão, se auto considera o “State of the art” das instituições políticas. As propostas da candidata fazem-me pensar numa canção italiana, creio que dos anos 60, que começava “Parolle, parolle, parolle….” Será que essa senhora, cuja colossal vacuidade mental é assustadora, sabe do que fala ao referir-se a uma hipotética VI República? Quanto tempo mais vai a França fazer colecção de repúblicas? Até chegar à VII, ou VIII, ou à IX, “tant qu’à faire”? A França já esgotou todas as formas possíveis de república, inclusive o presidencialismo puro durante a II República (1848-1852) e que tornou possível o auto-golpe de Estado de Napoleão III. Invoca-se por vezes, lá como cá, o mito do presidencialismo, esquecendo-nos de que este apenas tem funcionado nos Estados Unidos num contexto politico totalmente diferente do da Europa. Desde a queda da Monarquia a França não mais conseguiu reconhecer-se numa instituição legítima. A França tem, acima de tudo, uma profundíssima crise de regime e, com ela, de toda uma série de mitos jacobinos que lhe são consubstanciais e que a queda do Muro veio por em cheque e mesmo a condenar inevitavelmente ao colapso. O grande drama da França e de grande parte dos franceses é o de reconhecer que aquelas instituições, sobre as quais lhes é dito e incutido na escola desde a mais tenra idade que são as melhores do mundo, são na realidade um rotundo fracasso e acima de tudo, mas não só, uma forma institucionalizada de saque aos contribuintes. É isto a “République à la française” e, já agora, também à portuguesa. Isto num país que se considera um modelo, devendo por isso ser olhado pelos outros e não olha-los, é muito difícil de engolir. No fundo o dilema que se coloca à França é simples: ou o regime ou a França. Acredito que, no imediato, não seja a esta a questão que está em cima da mesa mas ela acabará por colocar-se dentro de relativamente pouco tempo quanto mais não seja devido à sua monstruosa dívida pública que já absorve 66% do PIB. Há um livro excelente que li no ano passado e que se chama “La république une affaire française” de Chantal Delsol que retrata muitíssimo bem toda a problemática associada ao regime e como este necessita de se reestruturar respeitando o princípio da subsidiariedade, isto é, evoluir para uma forma mais federal, o problema é que isto é incompatível com o regime actual. Além disso a França precisa de fazer uma psicanálise do seu passado. A história está a prestar homenagem a um dos mártires da Revolução: Luís XVI. O Evangelho do passado Domingo falava-nos da Parábola do Filho Pródigo creio que há algo de “filho pródigo” nesta França que, à semelhança deste, começa a estar farta de “chafurdar no lodo e de comer com os porcos”, quando é que ela decidirá “regressar à casa do Pai”? Quem será a personalidade, ou personalidades, e com que legitimidade, para encetar esse regresso? O problema é que não há nada mais difícil no homem do que reconhecer os seus erros, tanto mais que estes duram há já 200 anos (exceptuando o curto período da Restauração monárquica entre 1815-48 com Luís XVIII, Carlos X, o último Rei legítimo, e de 1830-48 com o usurpador Luís Filipe D’Orléans). Sigamos, pois, com interesse as cenas dos próximos capítulos até porque esta o que vier a acontecer terá consequências nos aspectos mais variados quer internos da França, quer externos.

14.3.07

O quebrar dos “nós e dos laços” ou como se dilui um país

O post do Corcunda intitulado “A Pátria no condicional” suscitou-me várias ideias que pensei escrever na caixa de comentários mas que bem vistas as coisas têm matéria suficiente para escrever um post. Lamento só agora o fazer mas não me foi possível mais cedo. Aqui está ele.
Infelizmente não é só a relação com a pátria que é colocada no condicional, mas todas as nossas relações. Num mundo hedonista tudo aquilo que não nos traz qualquer prazer, ou vantagem e que implique sacrifício, é imediatamente afastado. Porque perdemos a Fé, perdemos a Esperança daí que nada mais justifique o nosso sacrifício, ou esforço. Para melhor compreendermos a mudança que se operou na percepção que temos da Nação, há que ter presente que a nação surge, aqui na Europa, como expressão politica de uma comunidade religiosa, sendo a existência desta a condição sine qua non para esta se poder formar. Repare-se que esta entidade não tem, nem nunca teve, equivalente no mundo islâmico devido à estrutural incapacidade do Islão de separar o político do religioso. O problema de hoje na Europa com a total separação das duas esferas, devido à Revolução Francesa mas cuja génese remonta ao séc. XVI com a Reforma e a progressiva secularização das sociedades, é que as nações europeias se estão a diluir. O sinistro projecto, eufemisticamente denominado “Construção Europeia”, é o corolário de todo este processo no qual se tenta apagar da nossa memória colectiva toda a noção de pertença histórica. Como nos diz Pierre Manent no seu excelente livro “La raison des nations” falando a propósito do seu país, a França, mas que se poderia aplicar ao nosso, e passo a cita-lo: “Nós esquecemo-nos de que a criação do Estado neutro e laico pressupõe a existência anterior de uma nova comunidade sagrada, a nação precisamente. O Estado só pôde tornar-se neutro se, por sua vez, a nação francesa se tivesse tornado para a grande maioria dos cidadãos a “comunidade por excelência”, sucedendo assim à Igreja. Para que o Estado laico se tornasse possível, era necessário que “a França” tivesse substituído “a França católica”. (....)
O Estado laico não pode sobreviver ao Estado-nação. A sua neutralidade assenta na sua “transcendência”, e esta deriva do facto de ele ser o instrumento, o “braço secular”, da nação. A nação uma vez abandonada como comunidade sagrada, é o Estado laico que por sua vez é laicizado não sendo mais do que um dos vários instrumentos de governação cujo empilhamento eu já descrevi anteriormente. As comunidades até aí subordinadas à nação começam a separar-se e aspiram a governar-se a elas próprias”. Através das sábias palavras de Pierre Manent apercebemo-nos bem da tragédia a que estamos condenados se não fizermos tábua rasa de todo este veneno do laicismo que seca a “seiva” das nações estiolando-as, impedindo-nos de transpor a Esperança da comunidade cristã para o Estado laico o que acarreta o seu desmoronamento. Também Tocqueville na II parte do I livro da “Democracia na América”, no capítulo VI, ao falar-nos no espírito público nos Estados Unidos diz: “Existe um amor pela pátria que tem a sua origem no sentimento espontâneo, desinteressado e indefinível, que liga o coração do homem ao lugar onde nasceu. Este amor instintivo confunde-se com o gosto pelas tradições, o respeito pelos antepassados e a memória do passado. (…) Frequentemente este amor pela pátria é exaltado pelo fervor religioso, e nesse caso é capaz de prodígios. Ele próprio é uma espécie de religião: não se explica, sente e age.” Vemos também por estas palavras de Tocqueville que o substrato religioso é fundamental para cimentar um país. Podemos afirmar que todo este processo de descristianização da Europa, resultado da Revolução Francesa, filha do Iluminismo, é concomitante com a expansão da democracia e por esta acelerada. Tocqueville explica-nos, como só ele o poderia fazer, como é que a democracia ao destruir os laços sociais e facilitando a atomização igualitária da sociedade (expressão de Hannah Arendt) leva os homens a “uma incredulidade instintiva pelo sobrenatural” (Cap. II de, “De la Démocratie en Amérique II) tanto mais que estes, no mundo democrático, “apenas estão ligados por interesses e não por ideias” (Ibidem Cap. I). O complemento natural, e um dos seus artificies como lhe chama Pierre Manent, desta terrível máquina produtora de igualdade de pensamento, que é a democracia, é naturalmente o “Estado-providência” que ao garantir os mesmos direitos e regalias a todos os cidadãos os desresponsabiliza perante os seus semelhantes, nomeadamente os seus familiares, e os leva a considerarem-se apenas titulares de direitos sem quaisquer deveres. Esquecemo-nos de uma coisa tão simples e tão cristã: praticar a caridade, que é algo que começa em casa. No fundo este “Estado-providência” é um magnífico instrumento de “despotismo democrático”, para usar a expressão de Tocqueville. Perante isto, pergunto, que há de surpreendente no facto de se colocar “A Pátria no condicional”, bem como todas as restantes relações humanas?
António Bastos

6.3.07

Os intolerantes da “tolerância”

“Quem diria que a tolerância também possui os seus fanáticos?”, Malesherbes

Assisti há alguns dias na RTP2 a um programa intitulado, se não me engano, “Sociedade civil”, para cuja transmissão tinha sido alertado. O dito programa propunha-se fazer um autêntico “Auto-de-fé” do incorrectamente chamado “Antigo Regime” (II República). A necessidade de o fazer prende-se com o estranho comportamento de alguns “saudosistas”, e por isso “tarados”, que votaram naquele “sinistro ditador”, António de Oliveira Salazar, chegando mesmo ao desplante de o colocar numa posição folgada na dianteira. No programa participaram, para além da entrevistadora, três entrevistados entre os quais se contava o historiador “oficial” do regime, Fernando Rosas. O programa além disso, e por inerência, tinha o “mérito” de vangloriar a actual III República na qual corre leite e mel, a corrupção não existe ao contrário do “antigamente”, e cujo crescimento tem assentado no investimento em “capital humano” só possível pela excelência do nosso ensino tão invejado pelos nossos principais parceiros económicos e citado pela OCDE como O modelo. Aliás um das críticas feitas no programa ao regime diziam respeito ao sistema de ensino que aquelas “luminárias” classificaram de elitista, o que é um enorme elogio diga-se de passagem. Será que esses autênticos imobilistas não compreendem que ao baixar-se a “fasquia” no ensino, devido aos mitos igualitários, se está a impedir a ascensão social de quem tem mérito, a desvalorizar os diplomas e as profissões manuais, e a criar a ilusão de mobilidade social, logo, a gerar frustrados? Ocorre-me a afirmação de Saint-Just “Os infelizes são o poder da terra!”. Foi isso que se fez, em grande medida, no pós 25 de Abril. O programa terminou em apoteose com uma psicóloga, “soixante-huitarde”, que criticava a necessidade de autoridade e de as crianças obedecerem aos pais. Creio que lhe faria bem uma estadia numa daquelas periferias problemáticas de Paris ou Marselha, ou num dos bairros de onde são oriundos os hooligans em Inglaterra. Este nojento programa de propaganda é bem a imagem deste regime que se auto-considera dotado de todas as virtudes (incluindo a tolerância, que é um dos termos mais abastardados da actualidade) e eximindo-se porém da necessidade de as comprovar, e não concedendo a ninguém a possibilidade de servir de “advogado de defesa” do “condenado”. O problema é que perante o cada vez maior degradar da situação no nosso País este discurso “pega” cada vez menos, daí o desvario que o regime demonstra e a necessidade de recorrer a estas encenações.

António Bastos

3.3.07

Portas abertas

Paulo Portas é um homem de poder, para o poder e pelo poder. Não é novidade que quer, como sempre quis, fazer do CDS um partido que tome o espaço político do PSD. Aquela classe média de que Portas sempre falou gosta do poleiro que os laranjas lhe oferecem porque, quer queiramos quer não, a matriz ideológica social-democrata pouco interessa àquela estrutura partidária. Dirão alguns que são de centro-esquerda, outros de centro, ainda outros de centro-direita e, poucos mas significativamente alguns, de direita... enfim, moderada. É a salganhada que o PSD alberga, fruto desse arrivismo que proporciona, que o CDS do Paulinho das Feiras quer atingir. Ele sabe, como ninguém, que o PSD é o grande entrave de uma certa direita.
O homem tem porte, presença e imagem. Ninguém lhe tira o mérito do protagonismo que lhe têm oferecido nos últimos dias. Tudo de bandeja, como se tivesse chegado a manhã de nevoeiro. Sobretudo, Portas tem o estilo que escasseia nos poucos que em Portugal resistiram à loucura da ideia social do estado, à esquerda das garantias desresponsabilizantes do individuo e descaracterizantes da base moral. Em certa medida, Portas é quem consegue, bem ou mal, associar tamanha vontade de governar com tão persistente oposição a todos os clichés abrilinos do Portugal moderno.
A grande questão que tem que se colocar, sob pena de não compreendermos nunca o que move a atitude do lider centrista, é a de clarificar se o populismo que Portas cultiva serve a causa ou as pessoas da causa. E nada será de estranhar numa sociedade em que passam já 32 anos de camuflagem de intenções. É que a boa vontade esconde, por vezes, a execução do seu contrário. Normalmente, suplanta-se Portugal.